O Ayurveda entrou na minha Vida de mansinho, como vos referi no texto anterior, já a actualidade entrou de chofre, malcriada, sem sequer bater à porta e esperar que me preparasse para nascer. Foi assim, de repente conta a minha Mãe… ao som de Lara Lee e “lança perfume”.
A actualidade apanhou-me nua, há 42 anos. Apanhou-me desprevenida, ainda faltavam alguns dias para a data prevista do meu parto. Ainda tinha de tratar de uns assuntos, não se apanha assim um Ser indefeso sem saber para o que vai.
E assim foi, e assim é até hoje.
A actualidade apanha-me de surpresa sempre que penso que o Ayurveda me traz em porto seguro (logo agora que tinha finalmente encontrado o equilíbrio das minhas rotinas entre filhos, cursos, trabalho e relacionamentos).
Agora que o tempo toma outro tempo percebo que aquilo a que chamo Vida é facilmente traduzido por actualidade pois a Vida é de facto aqui e agora. A vida é extremamente actual, sempre na crista da onda, aparece sempre no tempo certo e só isso permite Viver a Vida. Tudo o resto é viver de sonhos ou memórias, planos ou frustrações.
Essa é para mim a magia do Ayurveda, ter sempre uma resposta “na ponta da língua” para qualquer rasteira pregada pela Vida, se é que a Vida prega rasteiras à própria Vida, pode ser que tenha especial afinidade por pregar partidas aos meus planos.
Como também já abordei no texto do mês passado, sempre tive uma afinidade quase inexplicável com a verdade, com o que é certo. Eu não era apenas uma treinadora de bancada, eu era uma treinadora incompreendida.
Felizmente, em 2007 o Ayurveda chegou até mim pelas palavras de um médico de formação tradicional com especialidade em Ayurveda, Dr. José Ruguê. Desde esse momento o Ayurveda começou a influenciar a minha vida num processo permeado por várias mudanças, muitas dolorosas, mas que me permitiram uma análise autoconsciente, da minha personalidade e entendimento do mundo que tinha sido até então altamente ilógico, castrador e sem sentido.
O grande segredo da minha felicidade actual não foi o facto de me ter formado como Terapeuta mas sim o privilégio de ter sido agraciada pela presença constante dos meus Professores que me ensinaram acima de tudo a me curar primeiro para depois poder curar os outros. Mas eu não me sentia doente. Precisei de alguns anos para entender este conceito de Saúde no Ayurveda. Eu não me sentia doente mas estava longe de estar plena. Sentia-me revoltada e infeliz mesmo sem saber porquê. Foi com o Ayurveda e o Yoga, a prática diária, a dedicação, a auto determinação de fazer um caminho diferente e o apoio incondicional dos meus Professores (Dr. Ruguê, Dr. Avinash Lele e Dra Bharati Lele) que me entreguei a um processo de anos, que continua ainda, de aquisição e manutenção de uma postura auto-observadora da mente, corpo e condicionamentos e sua fragilidade e flutuação de acordo com a dinâmica dos cinco elementos, pancha maha bhutas, presentes no universo. A identificação dos meus padrões mentais, emocionais e o religar com o espírito, com a espiritualidade com a a importância da gratidão e devoção.
Não quero porém fazer passar que este processo de anos foi uma experiência esotérica. Ela foi e continua a ser uma experiência bem real baseada em avaliações concretas ao meu corpo físico, emocional e mental. Ainda hoje as perguntas continuam a ser as mesmas sobre a minha fisiologia: digestão, sono, pulso e por fim as minhas queixas emocionais e processos mentais. É uma relação de anos e ainda assim me surpreendo com a forma como me lêem através da minha expressão corporal, do meu jeito de falar e principalmente através do meu silêncio. Alguns me perguntam porque ainda preciso de consultas agora que sou terapeuta ao que respondo: “preciso principalmente agora que sou terapeuta pois a minha mente ficou mais forte nos argumentos e o meu corpo mais refinado nas queixas”. Sim, agora mais do que algum dia percebo com clareza os meus processos e a espécie de cegueira que nos caracteriza nas nossas “auto-avaliações” e agradeço de coração o privilégio de ainda os ter ao meu lado.
Até hoje aplico na minha vida e de forma profissional como terapeuta, os diversos conhecimentos e terapias do Ayurveda. Nesse processo surgiu a intenção de inspirar o estudo e a vida do Ayurveda através destas rubricas nos quais partilho a minha experiência por meio do sentido que esta prática de Vida deu à minha visão de mundo e do despertar da consciência de que a Vida é de facto um presente que necessita de um cuidado e carinho constante tornando-se a sua manutenção bem mais exigente do que um doutoramento em bonsais. Para passarmos com distinção e louvor nesta experiência a que chamamos VIDA precisamos resgatar natureza do Ser e isso é algo que não se consegue apenas estudando conceitos filosóficos em livros e palestras. É algo que precisa ser praticado e descoberto pessoalmente num mergulho profundo nas dimensões internas da mente e da consciência. Desenhei um programa para isso a que chamei ecologia pessoal e do qual podes saber mais informações se assim o desejares através de www.bmqbylaralima.com.
Despeço-me por aqui prometendo regressar em Setembro.
Lara Lima
Terapeuta de Medicina Ayurveda, Coimbra